O negócio está pronto a arrancar: branding criado, já registou o CAE principal da sua atividade, todos os recursos humanos na empresa dominam o setor, a presença nas redes sociais está garantida e, logo que exista uma base de dados robusta o suficiente, o email marketing será mais uma ferramenta para comunicar.
Porém, algo vital foi esquecido e necessita, urgentemente, de ser alinhavado: o tom de voz. A personalidade da marca.
Por outras palavras, a forma como todos os integrantes da empresa vão comunicar para o exterior. E, quando referimos “todos”, falamos também dos canais existentes: a newsletter que virá no futuro, os emails enviados diariamente a clientes ou fornecedores e a narrativa criada, por exemplo, no Instagram, Facebook, LinkedIn ou no site institucional.
Pode parecer um pormenor mas, como iremos observar nos exemplos apresentados, trata-se de um pormaior. A voz única de uma organização destaca-se no universo onde compete. Mostra, ao recetor da mensagem, quem vem lá. Que não é aquela empresa que apenas faz isto ou aquilo. É, sim, a marca! Todos a reconhecem: aqueles que nos fazem recordar os seus produtos ou serviços através da palavra. Séria ou divertida, formal ou informal, cinzenta ou colorida.
Não existe, ainda assim, uma fórmula correta; há, sim, uma necessidade imperiosa de definir a comunicação, tornando-a única e, não menos relevante, capaz de refletir a cultura empresarial.
Esta tarefa exige um trabalho estratégico que pode ser realizado por alguém in house, com habilitações/capacidades para o executar ou, em alternativa, por profissionais especializados na área: copywriters, consultores de comunicação ou agências de marketing e publicidade, capazes de trazer uma abordagem criativa, mas adequada ao negócio.
Como definir o tom de voz da sua marca
Caneta e papel. Este é, após completado um exaustivo benchmarking, o material que deve utilizar para a criação do tom de voz do seu negócio. Agarrada a caneta, deve, no papel, documentar tudo para que mais tarde não sejam identificadas incoerências. A consistência começa a ganhar forma neste passo.
Ser transversal também ajuda: redes sociais, email marketing, site, comunicação via email, eventos corporativos ou ações de marketing ou publicidade. Tudo conta, tudo é a voz da sua empresa.
Identifique, com clareza, quem é o seu público, os seus clientes, quem interage nas suas redes sociais; é a estes que deve adaptar o seu tom de voz, pois são eles a alavanca do seu negócio.
Nota: todos na organização devem ter acesso a este documento. Ninguém deve ficar fora deste processo.
Tom de voz: Tu ou Você?
Ainda que seja redutor limitar a definição do tom de voz de uma marca ao uso do “tu” ou do “você”, acaba por ser uma importante escolha já que mostrará, logo de início, uma abordagem distinta para quem é impactado pela mensagem.
Aqui, como noutros momentos, a sensibilidade de quem dirige a empresa é fulcral para perceber quem é o seu público: se este aprecia o “tu” informal, ou, por outro lado, se se poderá sentir de alguma forma ofendido por esse caminho de maior leveza. Se for um terceiro a efetuar este trabalho, o briefing deverá ser bem transmitido para que este saiba, sem margem de erro, quem são os interlocutores.
A Margão, por exemplo, apesar de ser uma marca com uma forte presença no mercado nacional e até virada para um público acima dos 35 anos, opta por um tratamento mais próximo, usando a 2ª pessoa do singular, ainda que a definição do tom de voz, como sublinhado em cima, não se esgota neste detalhe.
Apesar do “tu”, como se pode no exemplo em baixo retirado do Instagram, opta-se quase sempre por um caminho de conforto associado à cozinha e às receitas que nela são criadas. O “tu”, aqui, não representa informalidade, mas tão só uma proximidade com quem partilha a cozinha e as especiarias com o seu público.
Essa via, de uma maior informalidade, com um “tu cá, tu lá” aspiracional, faz parte da estratégia da Ipanema Portugal. O seu público, jovem e aberto a uma linguagem mais ousada, pretende que lhe toquem à porta dessa forma, não de outra. As sandálias são para ser usadas num contexto de calor, praia, relaxamento, e a comunicação deve refletir esse cenário, tal como podemos verificar no seguinte exemplo:
Numa área mais sensível como o imobiliário, onde, em média, as famílias realizam o seu investimento mais elevado, também é possível definir um tom de voz leve, sem deixar cair a 3ª pessoa do singular.
A ERA Portugal é, neste particular, um excelente exemplo: trata o negócio com a solenidade exigida, não deixando de colocar humor à mistura — retirar o peso a um processo por vezes moroso e capaz de defraudar as expetativas é o exercício realizado pela imobiliária. Ora veja esta publicação feita no Instagram:
Storytelling: Tom de voz para contar histórias
Há quem opte por comunicar contando histórias. É necessário algum enquadramento e saber fazer, mas é possível aplicá-lo com eficácia: a The Modern House, imobiliária britânica, faz do storytelling a sua casa: para, mais tarde, quem chegar até ela, procure, então, a sua.
A viagem começa no seu site, onde se podem encontrar entrevistas com arquitetos, decoradores de interiores ou designers, tem paragem pelas redes sociais, nomeadamente no mais visual Instagram e desemboca na newsletter enviada.
A meio da jornada, lembramo-nos que também vendem casas. Trata-se de uma abordagem arrojada e indireta, mas igualmente eficaz: o consumidor, cada vez mais informado e inflamado com tantos estímulos digitais, quer, bastas vezes, um abrandamento no acelerado ritmo de vida do século XXI. A The Modern House faz isso na perfeição.
Estratégia que encontra eco no Airbnb, embora com nuances, já que o seu site é criado apenas para arrendamento de casas, não oferecendo a componente aspiracional da The Modern House. A arte de contar estórias fica remetida apenas para as suas redes sociais, como pode ver no seguinte exemplo:
Ousadia ou agressividade (no bom sentido)
Definir um tom de voz mais ousado ou agressivo pode ser um trilho bem escolhido se quem for impactado pela sua comunicação aceitar ou, melhor, apreciar essa abordagem.
A Nike fá-lo, associando-se a causas humanitárias e testando os limites dos seus atletas, transpondo esse desafio para clientes e seguidores:
Por outro lado, aposta no minimalismo, que tem o seu melhor exemplo no logótipo, muitas vezes apresentado sem quaisquer referências verbais.
Embora em territórios diferentes, é também nos mares da ousadia que a Sumol navega, dando voz a jovens irreverentes, representantes de uma geração que vê o mundo de forma diferente. Ter este público como consumidor da sua marca permite criar um tom de voz — além do próprio branding — direcionado para este universo mais disruptivo. O Instagram da marca materializa tudo aquilo que acabamos de dizer.
A voz do próprio especialista
Embora em alguns setores possa ser complexo, há quem dê aos seus próprios profissionais a voz da marca: veja-se o exemplo da Peixaria Centenária, que fala como se fosse uma peixeira ou peixeiro, criando uma ligação íntima, de bairro, com os seus clientes.
Das redes sociais ao site, passando pelas entregas online à newsletter, tudo obedece a um padrão definido: é a peixeira ou peixeiro que aborda os clientes. Nunca outros.
Faça como recomendamos: pegue na caneta e no papel (ou na sua aplicação de notas digital, claro), e comece já a desenhar o tom de voz da sua empresa.